Relatório da ANM aponta que Braskem não cumpriu exigência de fechar mina em Maceió e usou areia irregular

O afundamento em Maceió de uma das minas da Braskem, que desacelerou ontem, ocorre após irregularidades e atrasos da empresa no processo de fechamento de seus poços de exploração de sal-gema na capital alagoana. Relatórios da Agência Nacional de Mineração (ANM), que acompanha desde 2020 o planejamento da mineradora para fechar as 35 cavidades que operava às margens da Lagoa de Mundaú, apontam que a Braskem levou quase dois anos para definir o fechamento da Mina 18 com areia, mesmo método usado em outros oito poços.

A empresa alega que cumpriu as recomendações das autoridades. O preenchimento desta mina, porém, nem começou: estava previsto para o dia 25, quatro dias antes de a Defesa Civil de Maceió emitir o primeiro alerta de risco de colapso. Mesmo nos outros poços, que tiveram o trabalho iniciado, o Ministério Público Federal apontou irregularidades no material usado e chegou a suspender a extração de areia usada pela mineradora.

De acordo com a Defesa Civil, a Mina 18 registra um afundamento de 1,8 metro desde a semana passada. No acumulado de 24h, medido ontem à noite, o movimento foi de 6,3 centímetros, menos do que os 7,4 centímetros detectados na noite anterior e do que os 11,8 centímetros registrados no sábado.

Ainda assim, o órgão manteve o aviso de “alerta máximo devido ao risco iminente de colapso”, com recomendações para que a população evite a região. Na manhã de ontem, o ritmo de afundamento chegou a ser de 0,25 centímetros por hora, um dos menores registrados desde o início do alerta, mas se acentuou ligeiramente ao longo dia, para 0,26 centímetros por hora.

A responsabilidade da Braskem pelo afundamento do solo, associada à extração de sal-gema no bairro Mutange que afetou outros quatro bairros vizinhos onde viviam 57 mil pessoas, foi atestada por estudos técnicos do Serviço Geológico Brasileiro (CPRM) em 2019. No ano seguinte, a ANM, agência vinculada ao Ministério de Minas e Energia, determinou que a empresa apresentasse um plano de fechamento das minas de sal-gema, conforme as peculiaridades de cada uma. Somente em fevereiro de 2021, dois anos após o caso ser associado à atividade da Braskem, a empresa registrou um plano de fechamento da Mina 18 — a segunda maior das 35 cavidades, com 494 mil m³ à época.

O plano original, porém, previa apenas o tamponamento do acesso ao poço, sem o preenchimento de todo seu volume. Em maio de 2021, conforme relatório da ANM, a Braskem informou que estava reavaliando a decisão porque, ao iniciar o processo, “constatou-se que a cavidade se encontra despressurizada, impossibilitando assim, seguir com o plano de fechamento”.

Somente em fevereiro de 2022 houve a alteração do planejamento, incluindo a Mina 18 entre as que seriam preenchidas com areia. Na ocasião, a mudança foi submetida pela Braskem e aprovada pela ANM.

Das nove minas selecionadas para fechamento com areia, a Mina 18 seria a penúltima a ter o processo iniciado, segundo cronograma divulgado pela Braskem no último mês. A demora ocorreu mesmo com sinais de evolução do afundamento nos últimos meses. Em junho e agosto, medições com sonares registradas em novo relatório técnico da ANM indicaram que a Mina 18 tinha uma “configuração complexa de cavidades segmentadas e conectadas por uma passagem estreita”, indicando que parte do poço já vinha cedendo. Na ocasião, o volume total medido foi de 489 mil m³.

Houve nova redução de volume, mais brusca, em nova medição no início de novembro, quando a Defesa Civil registrou 116 mil m³ na mina — 75% a menos do que nos meses anteriores.

Procurada pela reportagem, a Braskem informou ter seguido prazos pactuados com a ANM, além de se basear em estudos nacionais e internacionais para definir a técnica de fechamento de cada poço. Segundo a empresa, o preenchimento da Mina 18 não teve início “por conta dos microssismos e movimentações atípicas” detectados nas últimas semanas, e que estão associados ao afundamento acentuado nos últimos dias.

A mineradora alegou ainda que a redução de volume da Mina 18 desde o início deste ano estava “na margem de erro do método de varredura por sonar”, e por isso não exigiria “qualquer ajuste nas medidas já definidas”.

Segundo o último relatório da ANM, de outubro, a Braskem concluiu o preenchimento de três minas com areia, e estava em processo de conclusão de mais duas. Por conta de abalos sísmicos nas últimas semanas, outras duas minas tiveram seus preenchimentos interrompidos, enquanto a Mina 18 sequer teve início. Há ainda uma cavidade que, embora fosse previsto colocação de areia, encontra-se “relativamente estável”, e a Braskem pede uma reclassificação para não exigir preenchimento.

Nos casos em que já houve colocação do material, também houve problemas. Em fevereiro deste ano, o MPF instaurou procedimento para apurar indícios de extração irregular de areia por parte de duas empresas apontadas como fornecedores da Braskem: a Blocompacto e a Mandacaru Extração. No mês seguinte, uma operação do MPF junto à Polícia Federal e à ANM interditou os terrenos das duas empresas e suspendeu a extração. Àquela altura, cinco minas da Braskem estavam sendo preenchidas.

A denúncia foi protocolada pela vereadora de Maceió Teca Nelma (PSD), que apontou indícios de que os fornecedores da Braskem estavam indo além das áreas autorizadas de extração para retirar areia da localidade conhecida como Dunas do Cavalo Russo. Trata-se de uma área de proteção ambiental próxima à Praia do Francês, no município de Marechal Deodoro, a cerca de 30km de Maceió. Na operação, fiscais constataram que havia exploração de areia em área não autorizada.

— Eu mesma vi as escavadeiras retirando areia dali. Sob pretexto de resolver o problema em Maceió, estavam tapando o sol com a peneira — afirmou Nelma.

Dois meses após a interdição, a ANM voltou a liberar sete lotes de extração das empresas. O MPF informou que não pode comentar o caso porque segue investigando a extração irregular, que configuraria crime ambiental. Em notas divulgadas à época da operação, a Braskem informou trabalhar com fornecedores de areia licenciados pelos governos estadual e federal. A reportagem não conseguiu contato com a Blocompacto; a Mandacaru, que não quis comentar o caso.

Com informações do GLOBO.

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