Um axioma político para 2024: por Claudio Tognolli

O Centrão deixou de ser coadjuvante no Congresso e passou a comandar políticas de estado, em 2023.

Foi no no governo Temer (MDB) que Centrão esteve pela primeira vez no poder. Anteriormente, um partido político (PT ou PSDB) ganhava as eleições e liderava uma coalizão de partidos então chamados de “fisiologistas”, que precisavam se subordinar às pautas e agendas do mandatário de turno. Esses partidos oscilavam de acordo com o governo para fazer parte do poder, com menos emendas e mais comando dos cargos de segundo escalão do que acontece hoje.

Se o União Brasil perdeu sua posição conservadora e passou a integrar ministérios no governo de Lula da Silva, é possível que o PT continue investindo no progressismo de esquerda? Essa era a pergunta atéa primeira semana de dezembro de 2023.

O PT de Lula aprovou o texto-base de uma resolução política com críticas ao Centrão, grupo de partidos que fez aliança com o governo.

O documento de sete páginas também critica o Banco Central (BC) e diz ser necessário “se libertar” do que chamou de “austerício fiscal”, sem mencionar diretamente a meta de zerar o rombo das contas públicas no próximo ano, estabelecida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

O documento foi proposto pela corrente “Construindo um novo Brasil”, mesma tendência de Lula e majoritária no partido, durante a Conferência Eleitoral do PT, realizada em Brasília.


O texto faz críticas ao Centrão, grupo de partidos que apoiam o presidente Lula e que têm ministros no governo.

“Vencemos numa campanha de frente ampla, para fazer um governo de coalizão, mas é inegável que nosso campo político permanece minoritário no Congresso Nacional. As forças conservadoras e fisiológicas do chamado Centrão, fortalecido pela absurda norma do orçamento impositivo num regime presidencialista, exercem influência desmedida sobre o Legislativo e o Executivo, atrasando, constrangendo e até tentando deformar a agenda política vitoriosa na eleição presidencial”, afirma o texto aprovado nesta sexta-feira.

Ninguém sem deixou levar. Afinal temos dois Centrões: um raiz, kamizake e de direita, capaz de qualquer coisa para chegar ao poder com quem quer que seja. E outro Centrão mais contido, com nada de kamikaze ou de direita.

Apesar da crítica do PT ao Centrão, pública desde 9/12/23, o fisiologismo continua.

Há quem diga, nos estudos teóricos, que isso é um sinal dos tempos, já que estaríamos vivendo o fim daquilo de Stendhal chamava de promesse de bonheur (promessa de felicidade) ? e o que estaria acontecendo mesmo seria aquilo previsto por Max Weber como sinnerlust, ou um desencanto geral. E, num processo desses, num mundo cada vez mais caleidoscópico, velhas ideologias, mesmo as sepultadas pela história, estariam servindo de espiráculo para jovens. E que alianças políticas improváveis passem a ser a ordem do dia. Como PT e Centrão.

Teóricos dirão: no fim de um mundo bipolar, em que a ideologia muda na rapidez do zapping da televisão, cabeças juveniilistas fariam de seu pensamento uma extensão do controle da televisão ? (lembremos, nesse mundo caleidoscópico, de Íxion, herói tessálio condenado por Júpiter a fazer girar eternamente uma roda ardente à qual estava amarrado). Ideologias perdidas são para o juveniilismo a Fata Morgana da vez ? aquela semivadeante e gasosa miragem que se produz nas costas da Calábria.

Fim de ideologia não é novidade. O termo, originalmente, foi criado por Albert Camus. Gerou “n” obras, dos anos 1950 para cá: O Deus que Falhou, de R. H. Crossman (com textos de Koestler, Silone, Gide, entre outros); um punhado de ensaios de Arthur Koestler e Ignazio Silone, o famoso O Ópio dos Intelectuais, de Raymond Aaron e, last but not leastThe End of Ideology on the exhaustion of Political Ideas in the Fifties, de Daniel Bell, lançado em 1960 em primeira edição e agora relançado pela Harvard Uviversity Press. O problema é que, hoje, avançou a interpretação do fim das ideologias, que ora ganha o status de perda de sentido, de irracionalismo, sobre o que há o belíssimo extrato de Sérgio Paulo Rouanet:

“Não podemos falar em clima irracionalista sem falar em atores que o defendam ou em suportes que o sustentem. Um tanto impressionisticamente, diríamos que esses suportes incluem, por exemplo, sub-culturas jovens, em que o rock funciona como instrumento de sociabilidade intragrupal e de contestação geracional do sistema. Nelas, os estereótipos de uma formação livresca são contrapostos a imagem da educação pela própria vida. Reconstitui-se, espontaneamente, sem que os jovens saibam disso, a polarização clássica entre a vida e a teoria, que floresceu, por exemplo, no Sturm und Drang, no romantismo, no atual movimento ecologista e em outras correntes direta ou indiretamente influenciadas pela máxima de Goethe ?cinzenta é toda teoria, e verde apenas a árvore esplêndida da vida?. Incluem também alguns intelectuais, que não hesitam em desqualificar a razão, de modo quase sempre indireto, sob a influência de certos modismos, como a atual vaga neo-nietszchiana. E incluem determinados movimentos e partidos políticos, que tendem a recusar a teoria e fetichizar a prática. Teríamos assim, do ponto de vista dos atores, algo como um irracionalismo comportamental, um irracionalismo teórico e um irracionalismo político”.

Você pode optar pelo foco de que vivemos uma ruptura de ideologias. Ou não. Mas caso optar pela segunda alternativa, em 2024 vai ser pego de calças curtas….

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