Em nova audiência realizada nesta segunda-feira (18) pela 12ª Vara Federal de Belo Horizonte, a Vale S/A assumiu compromissos nas áreas territorial, de saúde e infraestrutura junto aos povos indígenas atingidos pelo desastre do rompimento da barragem da mineradora em Brumadinho (MG). O acordo foi firmado com a participação do Ministério Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública da União (DPU), a partir de pontos indicados, durante a audiência, pelas lideranças das comunidades indígenas dos Pataxó e Pataxó Hã-Hã-Hãe, tanto da Aldeia Naô Xohã, situada na Chácara São Dimas, quanto da Aldeia Naô Xohã-Paraopeba, ambas no município de São Joaquim de Bicas. Os compromissos foram realizados no âmbito da ação ajuizada conjuntamente pelo MPF e pela DPU, que trata da realocação da comunidade da aldeia Naô Xohã do povo indígena Pataxó e Pataxó Hã Hã Hãe.
Participaram da audiência, conduzida pelo juiz federal Daniel Carneiro Machado, lideranças das comunidades indígenas, o procurador da República Edmundo Antonio Dias, o defensor público federal João Márcio Simões, representantes da mineradora Vale, da assessoria técnica independente (ATI) Insea e da consultoria Ieds, responsável pelo diagnóstico de danos sofridos pelos Pataxó e Pataxó Hã Hã Hãe. Os indígenas que participaram da audiência se encontravam na Aldeia Naô Xohã quando seu território, situado em São Joaquim de Bicas (MG), foi inundado pelas águas do rio Paraopeba, em janeiro de 2022. A inundação levou novamente, para dentro da aldeia, os rejeitos de mineração provenientes do rompimento da barragem da mina do Córrego do Feijão, de propriedade da Vale, em janeiro de 2019, no município de Brumadinho, com o que se agravou a necessidade de realocação da comunidade.
Novos territórios – Em relação à comunidade indígena do Povo Pataxó e Pataxó Hã-Hã-Hãe da Aldeia Naô Xohã atualmente situada na Chácara São Dimas, que se encontra sob a liderança do cacique Arakuã, a mineradora comprometeu-se a enviar uma minuta do contrato de comodato para análise da ATI Insea, que deverá devolver a análise até hoje (21). A Vale também deverá providenciar a instalação da escola e do posto de saúde, na área que está sendo adquirida pela Vale, antes do início das aulas em 2024. A empresa se comprometeu, ainda, a manter a logística de transporte até então adotada.
No que se refere à comunidade indígena do Povo Pataxó e Pataxó Hã-Hã-Hãe da Aldeia Naô Xohã-Paraopeba, ficou acordado também que a Vale terá 30 dias para fazer uma prospecção e avaliação do valor de mercado de imóvel indicado pelo Cacique Sucupira por meio da ATI Insea, não se comprometendo, no momento, à sua aquisição.
Benfeitorias – Já em relação à comunidade indígena do Povo Pataxó e Pataxó Hã-Hã-Hãe da Aldeia Naô Xohã-Paraopeba, situada, sob a liderança do cacique Sucupira, às margens do rio Paraopeba, foram acordadas medidas de infraestrutura na aldeia, como a instalação de dois postes e um padrão de energia, em até 30 dias; a realização de um estudo técnico para avaliar a possibilidade de instalação/interligação elétrica nas estruturas já existentes, no período de 60 dias, a ser feito por empresa já contratada pela Vale; e, em relação aos banheiros da aldeia, a empresa deverá fazer melhorias internas (nas fossas sépticas) nas residências e na escola, no prazo de 30 dias para aquisição e instalação das fossas, contados a partir da vistoria que será realizada no local em 27 de dezembro.
Em relação aos níveis de cloro na água, a Vale também informou que já adquiriu o filtro para desclorificação e que ele será instalado na aldeia em até 15 dias. Parte dessas medidas havia constado entre os encaminhamentos acordados na audiência realizada no dia 25 de julho de 2023, mas ainda não foi cumprida pela mineradora.
Saúde – Ainda em relação à comunidade indígena do Povo Pataxó e Pataxó Hã-Hã-Hãe da Aldeia Naô Xohã-Paraopeba, a Vale deverá garantir o funcionamento da unidade móvel de saúde, também em até 60 dias.
Já com relação a ambas as comunidades indígenas, foi estabelecida a prorrogação, por mais seis meses – prorrogáveis sucessivamente –, do plano de atendimento e assistência complementar de saúde estabelecido no Termo de Ajustamento Emergencial (TAP-E), um acordo firmado em 05 de abril de 2019 pelo MPF, ao lado do povo indígena Pataxó e Pataxó Hã Hã Hãe, com a mineradora Vale e com interveniência da Funai.
Histórico – Com as chuvas que atingiram o Estado de Minas Gerais na primeira semana de janeiro de 2022, o nível das águas do Rio Paraopeba subiu drasticamente e assolou o território da aldeia Naô Xohã, em função da grande deposição de rejeitos de mineração expelidos, quando do rompimento da barragem da Vale na mina do Córrego do Feijão, o que reduziu o volume hídrico que a calha do rio comporta.
Com a inundação, as casas, o posto de saúde da aldeia e os banheiros da comunidade ficaram submersos e as famílias indígenas tiveram de ser resgatadas de barco pelo Corpo de Bombeiros, sendo que, à época, foram provisoriamente abrigadas numa escola municipal. Mas, quando puderam voltar para a aldeia, tiveram de conviver novamente com a contaminação ambiental proveniente dos rejeitos de mineração depositados no leito do Rio Paraopeba e que foram revolvidos pelas intensas chuvas, o que provoca o fenômeno denominado biodisponibilização.
Além disso, até hoje a comunidade indígena que permanece na Aldeia Naô Xohã, às margens do Rio Paraopeba, não conta com posto de saúde, e as placas de geração de energia solar instaladas pela mineradora não estão funcionando.
Pouco tempo após o ajuizamento de ação pelo MPF e pela DPU, a Justiça concedeu liminar que obrigou a Vale a apresentar um plano de realocação, além do pagamento mensal de verba de instalação e manutenção das famílias indígenas realocadas, incluindo aquelas que se viram forçadas a se deslocar em momento anterior à inundação da Aldeia Naô Xohã, no valor de um salário mínimo por grupo familiar.
A decisão também obrigou a Vale a respeitar os direitos à consulta livre, prévia e informada, e à participação no processo de escolha do local e de elaboração do plano, conforme prevê a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), observando-se também a lei estadual 23.795/2021, que instituiu a Política Estadual dos Atingidos por Barragens (Peab).
Ocorre que a área oferecida pela Vale para a realocação provisória da comunidade indígena tinha apenas 4,8 hectares e não comportava todos os Pataxó e Pataxó Hã Hã Hãe beneficiados pela decisão judicial, referente à situação causada pela inundação. Com isso, apenas parte da comunidade da Aldeia Naô Xohã deliberou ir para o local oferecido pela mineradora, denominado Chácara São Dimas.