Seguindo entendimento do Ministério Público Federal (MPF), a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento realizado nesta terça-feira (16), confirmou a possibilidade de fornecimento, pela União e pelo Estado de Pernambuco, de medicação à base de canabidiol (substância química da Cannabis Sativa) para tratamento de uma menor de idade com condição específica de saúde. O assunto é objeto do Recurso Especial 2.006.118 apresentado pela União e pelo Estado de Pernambuco contra decisão do Tribunal Regional Federal da 5a Região (TRF5), que liberou o uso do remédio nos termos da prescrição médica, com dosagem e tempo devidamente indicados.
Constam do recurso contra a determinação do TRF5 os argumentos de que não há registro do remédio na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e que existem leis para vedar o fornecimento do fármaco. No documento, a União e o Estado de Pernambuco também alegaram a ausência de estudos comprobatórios da eficácia do medicamento e sustentaram que há tratamento eficaz disponível no Sistema Único de Saúde (SUS), além da possibilidade de tratamento experimental em centros acadêmicos de pesquisas acompanhado pela indústria farmacêutica.
Contra essas argumentações, o MPF defendeu que o TRF5, ao deferir o pedido do tratamento, demonstrou, por meio de laudos e outras provas, que existe, nesse caso concreto, uma excepcionalidade que justifica a utilização do medicamento mesmo que a substância não tenha autorização da Anvisa. O TRF5 considerou, por exemplo, que não há provas da ineficácia do canabidiol. Argumentou que, em favor da menor, há prescrição médica recomendando o uso do medicamento sendo que a indicação do canabidiol, na tentativa de melhorar a qualidade de vida da beneficiária, foi impulsionado pelo fato de que os tratamentos disponíveis no SUS não surtiram o efeito desejado, conforme constatado em laudo de perito judicial.
Em relação à ausência de registro do fármaco na Anvisa, o TR5 afirmou que a burocracia excessiva no procedimento da agência ocasiona atraso na liberação de medicamentos cuja eficácia já foi comprovada em outros países, como é justamente o caso do canabidiol. Sustentou ainda que a Anvisa já autoriza a importação do fármaco. Nesse mesmo sentido, em sustentação oral realizada no julgamento da Segunda Turma do STJ, o subprocurador-geral da República Nicolao Dino mencionou autorizações sanitárias já expedidas pela Anvisa. “A agência já aprovou um total de 16 produtos medicinais à base de extrato de Cannabis Sativa, sendo que dez deles são fitofármacos elaborados a partir de canabidiol. Portanto, o voto do eminente relator vem ao encontro daquilo que se espera em termos de direito ao acesso à saúde tal como vem sendo reconhecido por essa egrégia Turma”, pontuou.
O MPF também defendeu, em parecer assinado pela subprocuradora-geral da República Maria Soares, que a Constituição Federal estabelece que é dever do Estado prestar assistência à saúde. Reforçou ainda que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal que estabelecem que a União e qualquer um dos entes federados têm legitimidade para figurar no polo passivo das demandas em que se pleiteia concessão de medicamentos ou qualquer outro serviço ou produto destinado à saúde.
O relator do caso no STJ, ministro Francisco Falcão, votou de acordo com posicionamento do MPF e foi acompanhado pelos outros ministros que compõem a Segunda Turma da Corte.