Os tribunais brasileiros registraram em 2023 um total de 176.055 processos judiciais envolvendo casos de racismo ou de intolerância religiosa, revela um levantamento feito pela startup JusRacial.
Segundo a colunista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, os tribunais dos 26 estados e do Distrito Federal somaram, juntos, 74.613 ações relacionadas aos dois temas no ano passado. Nas cortes superiores, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) recebeu 4.292 desses casos, e o STF (Supremo Tribunal Federal), 1.907 deles.
A Justiça Trabalhista também guarda números expressivos de ações, o que indicaria a incidência dessas práticas em locais de trabalho, segundo a JusRacial. Do total de processos contabilizados, mais de 64 mil deles tramitavam em Tribunais Regionais do Trabalho, e outros 11.147, no TST (Tribunal Superior do Trabalho).
Ações iniciadas por acusações de racismo representam mais de 117 mil do total analisado, ante 58.232 que têm a prática de intolerância religiosa como motivação para sua abertura.
Comparado a 2009, ano do levantamento mais recente, em que foram contabilizados 1.011 casos do tipo, 2023 registrou um aumento superior a 17.000% no número de processos por racismo e intolerância.
Fundador da JusRacial e coordenador do Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras (Idafro), o advogado Hédio Silva Jr. diz que a inclusão da transfobia e da homofobia na categoria de crime de racismo explicam, em parte, o aumento expressivo dos processos. Mas não só.
“Sem dúvida alguma, essa explosão na judicialização de conflitos decorrentes do racismo e do racismo religioso tem a ver com a ampliação de consciência, por parte das vítimas, e com o espaço que esse tema ocupa hoje na agenda pública do país”, afirma.
“Tem a ver, também, com essa geração de jovens advogados e advogadas negras que se formaram pela via das ações afirmativas, e que certamente sentem na pele e se dispõem a levar mais casos ao Judiciário”, segue Silva Jr., que ainda destaca a atuação do MPT (Ministério Público do Trabalho) em ações coletivas relacionadas aos dois crimes.
No primeiro levantamento que coordenou sobre o tema, em 1997, o advogado identificou apenas nove casos relacionados ao termo “preconceito racial” registrados nos tribunais estaduais entre 1951 e 1988.
Na época, os dados foram obtidos por meio de cartas enviadas a cada uma das cortes. “Levei um ano para ter acesso aos dados”, conta ele.
Para o levantamento do JusRacial com base nos processos de 2023 os dados foram extraídos a partir de pesquisa feita diretamente nos sites dos tribunais. Algumas palavras-chaves foram combinadas durante a filtragem.
O material bruto ainda será fracionado pela startup e analisado a partir de outros recortes. A JusRacial tem como objetivo fornecer subsídio, jurisprudência, modelo de peças e outros materiais para advogados que atuam na defesa judicial da igualdade racial e da liberdade de crença.